Tuesday, February 27, 2007

A MAIORIDADE PENAL E O CARRASCO POPULAR

* Por João Baptista







O caso da morte de João Hélio, criança, de 6 anos, que ficou presa ao cinto de segurança e foi arrastada por sete quilômetros por assaltantes em atitude de fuga no Rio de Janeiro, trouxe ao país uma discussão um tanto complexa, que é a questão da redução da maioridade penal (de 18 para 16 anos de idade).

É óbvio que a sociedade brasileira e, em especial, os cariocas, vivem horrorizados com a violência, até mesmo pela dimensão a que evoluiu. Mas a violência é assunto genérico e, portanto, não deve ser encarado e debatido com o senso comum. Deve ser estudado, pensado de forma inteligente e não eivado de ódio e do senso de justiça norte-americano do olho-por-olho.

O debate trouxe reações diversas e até manifestações de parte da sociedade – classe média – em torno da discussão e é de causar espanto pelo grau de conservadorismo que a mesma agrega. A grande mídia brasileira (cite-se, como protagonista, a Rede Globo de Telecomunicações) tem tentado conduzir o debate e logrado êxito (o que é pior), levando o tema para o Congresso Nacional, o que torna mais preocupante ainda a abertura de um leque que poderá evoluir para Pena de Morte, mesmo que não passe, a priore, de uma mera discussão.

Que o Estado precisa tomar medidas urgentes para reduzir a criminalidade, isso é óbvio, contudo, é preciso analisar de forma acurada a causa da mesma e não encará-la – a causa - como se somente se encerrasse nas ações criminosas de uma juventude transviada. A criminalidade, na verdade, é uma doença social, derivada do individualismo exacerbado, do darwinismo social e, para tanto - para combatê-la - é preciso construir um remédio social eficiente que, não necessariamente, deva ser a redução da maioridade penal que, a meu ver, é um crime contra os direitos humanos.

Não obstante o fato de que a redução da maioridade penal implica, assim que se evidenciar crimes cometidos por crianças de sete, oito, nove anos de idade, em reduções gradativas e sucessivas, se a burguesia conseguir reduzir a maioridade penal, conseguirá, em nome da “paz” social, também invadir as favelas do Rio e matar gente inocente (como já o faz e fará com mais afinco), conseguirá, ao certo, matar favelados em todo o Brasil – o pobre é “quase” predestinado a, de fato, ser marginalizado (já o é por essência) ou mesmo tornar-se um marginal, o que, para um jovem de classe média alta é apenas um acidente de percurso – ocupar os presídios e chacinar jovens pobres que cometeram crimes diversos, legitimar os grupos de extermínio. A solução, para a burguesia brasileira – desprovida de valores humanos consistentes - é exterminar, pulverizar, destruir o “mal necessário”, como se a mesma não fosse a principal responsável pelo processo de marginalização dos muitos miseráveis em nosso país.

Ao invés de reduzir a maioridade penal é preciso, a bem da verdade, reformar/reformular o sistema prisional –que implica, desde a estruturação física e pedagógica dos presídios à formação policial - reabilitando ou reconduzindo pessoas marginalizadas ao convívio social; oferecer a Educação Pública, Gratuita, de Qualidade e para todos, impedindo o ingresso de jovens ao submundo do crime; combater obsessivamente a fome e a miséria nos bolsões de pobreza, nas favelas, etc; combater as disparidades sociais, construindo um novo sistema, novas regras e um outro modelo social possível.

Porém, a corrupção no aparelho estatal e a burocracia impedem a concretização de políticas afirmativas nesse sentido; as torturas policiais nos presídios, o tratamento desumano dado aos presos, a impunidade (como, por exemplo, a absolvição do coronel Ubiratan, responsável pelo massacre do Carandiru), a falta de estrutura, etc. A inserção de menores de 16 anos de idade no sistema prisional atual apenas dificulta ainda mais o processo de reeducação desses brasileiros.

Acredito que algumas indagações precisam existir na análise que orientará o debate sobre a redução da maioridade penal, quais são: “O que é a violência?”, “O que causa a violência”, “quem é o vilão?”, “quem é vítima?”. Ora, A fome não é a violência contra os excluídos? A desigualdade social não é a violência geradora inconteste das mazelas do mundo atual? Obviamente que sim.

Logo que se conclui que a desigualdade social é a principal violência geradora das doenças sociais (da criminalidade, por exemplo) é plenamente perceptível a dicotomia nas concepções que debatem o tema e está claramente dividida entre o pensamento burguês conservador e o progressista que são, na lógica marxista, a contraposição do pensamento burguês versus proletário. As questões ideológicas são o cerne do debate e a resposta positiva ou negativa ao que propõe a direita brasileira dependerá da opção da concepção de mundo que adotaremos.

O carrasco popular domina a discussão nas várias camadas da população, que são muito influenciadas pela mídia, todavia, é preciso questionar se somos deuses ou se homens, se adotaremos a moral cínica ou se buscaremos resolver a problemática tomados por sentimentos humanos e não distanciados da racionalidade.





* João Baptista é ex-presidente da UMES – União Municipal dos Estudantes Secundaristas de Imperatriz (2003/2005), Conselheiro Estadual de Segurança Alimentar (CONSEA/MA), membro do coletivo municipal de juventude do Partido dos Trabalhadores (JPT).

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